Seu trabalho tem futuro? (parte 1)

Todos sabem que o avanço da tecnologia reinventa o mercado de trabalho, substituindo e inventando profissões.

Nos últimos anos com o avanço da robótica uma nova ameaça passou a afetar esse cenário: a substituição da força de trabalho humana por um robô.

Essa publicação busca refletir sobre esse novo panorama mundial, e ajudar a preparar-nos para o futuro das profissões.


Quando, em 1956, o cientista da computação americano John McCarthy (1927-2011) cunhou o termo “inteligência artificial”, durante uma conferência na universidade de Dartmouth, nos Estados Unidos, a intenção já era desenvolver máquinas capazes de livrar os seres humanos de tarefas de alguma complexidade porém largamente enfadonhas. “A proposta é usar todo o nosso conhecimento para construir um programa de computador que saiba e, também, conheça”, resumiu McCarthy, expressando uma ambição que vem de muito antes de ele proferir tais palavras. 

Uma narrativa mitológica judaica, por exemplo, já apresentava, milênios atrás, a ideia de um ser artificial pensante, o Golem, feito de barro, e que serviria os humanos (na imagem ao lado).

Na Idade Média, alquimistas chegaram a sonhar em dar vida à criatura por eles batizada de Homunculus. Era apenas um devaneio que o tempo e a ciência se encarregaram de trazer para o plano das realidades.

E a inteligência artificial (IA) de hoje em dia, tal como foi formulada por McCarthy, é a concretização dessa aspiração que se confunde com a história. No entanto, no momento em que a humanidade parece estar perto de construir um robô capaz de substituir o homem em um sem-número de atividades — o Golem do século XXI —, o que poderia ser motivo de unânime comemoração arrasta consigo o pavor de que tais softwares deixem milhões de seres humanos desempregados.

A preocupação é tamanha que o tema ganhou lugar de destaque na agenda do Fórum Econômico Mundial — evento anual que reúne líderes políticos e empresariais —, que teve início na terça-feira 23 em Davos, na Suíça. Segundo levantamento feito pela organização do fórum, a soma de empregos perdidos para a IA será de 5 milhões nos próximos dois anos. 

O estudo propôs um esforço global, em especial por parte dos governos, para amenizar os impactos da tecnologia. As áreas de negócios mais afetadas serão as administrativas e as industriais. “O único fator com chance de limitar esse avanço é a vontade dos líderes, que poderão optar por investir na reconfiguração do mercado, promovendo a recolocação dos trabalhadores em oportunidades que surgirão”, disse o economista alemão Klaus Schwab, fundador e presidente do evento.

Case Amazon
Uma loja física recém-inaugurada pela Amazon na cidade de Seattle, nos Estados Unidos, na segunda-feira 22, é um exemplo lapidar do tremendo impacto que se dará com a, digamos assim, invasão dos robôs no trabalho. Nela não há atendentes. Quando o cliente escolhe um item nas gôndolas, um software conectado a milhares de câmeras de rastreamento adiciona automa­ticamente o produto a uma conta on-line. Caso ele mude de ideia, e devolva a mercadoria, esta é retirada da cesta de compras virtual. Na hora de pagar, não há fila: o valor é debitado da conta do cliente, que teve de se cadastrar antes de entrar no estabelecimento. Para tanto, bastou que passasse o celular, sincronizado com um aplicativo bancário, em um scanner postado na entrada da loja. Veja no vídeo como isso funciona:



Nesse admirável — e temido — mundo novo apresentado pela Amazon, mesmo nos bastidores da lida quase não há funcionários de carne e osso: o estoque é coordenado por IA. Aos humanos, restaram apenas umas poucas vagas de monitoramento — para checar, por exemplo, se ninguém com menos de 21 anos estaria adquirindo produtos alcoólicos, o que é ilegal nos Estados Unidos. Ou seja, o que essa empreitada indica é que no futuro não haverá mais entregadores, carregadores nem caixas nos supermercados. Só nessa última categoria existem 3,5 milhões de empregados nos EUA.

Futuro
Um estudo publicado em novembro pela consultoria americana McKin­sey avalia que em torno de 50% das atividades tidas como repetitivas serão automatizadas na próxima década. Nesse período, no Brasil, 15,7 milhões de trabalhadores serão afetados pela automação. Em outras palavras, caso seu emprego não exija muito de criatividade ou de habilidades lúdicas, é enorme a probabilidade de que venha a ser ocupado por alguma máquina.

 Em todo o mundo, o legado da mecanização avançada será de até 800 milhões de pessoas à procura de oportunidades de trabalho. Desse total, boa parte terá de se readaptar, mas 375 milhões deverão aprender competências inteiramente novas para não cair no desemprego. Nos países ricos, aonde a tecnologia chega primeiro, o impacto deve ser maior. Nos EUA e na Alemanha, um terço da força de trabalho terá de se reinventar. No Japão pode ser pior: metade das pessoas será substituída pela IA. “Do colarinho-branco ao chão de fábrica, teremos substituições”, disse o economista zimbabuano James Manyika, diretor da McKinsey, responsável pelo levantamento.

Em 2013, os economistas Carl Benedikt e Michael Osborne, ambos da Universidade de Oxford, na Inglaterra, publicaram um estudo no qual indicavam a probabilidade de uma série de carreiras ser extinta pela ascensão dos computadores-trabalhadores. Segundo seus cálculos, presentes na publicação The Future of Employment (O Futuro do Emprego), é muito próxima de 100% a probabilidade de profissões facilmente automatizáveis, como a de operador de telemarketing, sumirem do mapa de empregos ainda nos próximos dez anos. 

Por outro lado, há atividades que quase não serão afetadas. São aquelas que exigem capacidades humanas, demasiado humanas — como a criação artística, a psicanálise e as que requerem sensibilidade e perspectiva histórica sobre os acontecimentos (não por acaso, é de 0,7% a chance de arqueólogos serem destronados por robôs, de acordo com o levantamento inglês).

Pouco antes de deixar o cargo de presidente dos EUA, em janeiro de 2017, Barack Obama afirmou, em entrevista, que “os empregos estão acabando por causa da automação”. Ele também ressaltou que um dos exemplos disso seria “o Uber sem motorista” e que “as mudanças ocorrerão nos escritórios de todo o país”. A preocupação de Obama é que os governos não consigam acompanhar o ritmo das mudanças. Por isso, ele previu que nos próximos 25 anos as economias desenvolvidas terão de enfrentar uma escassez de vagas.

Nem todos, contudo, são tão pessimistas assim. Os economistas ingleses Richard e Daniel Susskind (pai e filho, respectivamente), ambos professores de Oxford, defendem, no livro The Future of Professions (O Futuro das Profissões), a ideia de que quando atribuições são extintas, ou modificadas, os seres humanos se transformam no mesmo ritmo. “O benefício é que os profissionais farão mais, em menos tempo”, escreveram. Para eles, a bonança tecnológica levará à criação de novos tipos de emprego. A tese também é defendida pelo engenheiro de automação Arthur Igreja, da Fundação Getulio Vargas do Rio: “No futuro, assumiremos funções ligadas aos nossos interesses. Serão trabalhos com valores de produção diferentes dos que temos hoje”. 

Como em tecnologia o futuro não dura muito tempo, é prudente “humanizar-se” cada vez mais profissionalmente.

E você: como está se preparando para essa revolução?


Fonte:
Revista Veja 31 de janeiro de 2018

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